Convite às Aldeias: Crie sua própria Unidade Produtora de Cauim Contemporâneo como Espaço de Cultura Viva


Convidamos as aldeias indígenas que desejarem ser optantes a sediar uma unidade produtora de cauim contemporâneo em suas próprias dependências. A ideia é simples, mas poderosa: criar um espaço onde a cultura material ancestral se entrelace com a hospitalidade, proporcionando a visitantes uma imersão completa na tradição e história de cada povo.

Essas unidades poderão contar com instalações para acolher turistas, compartilhar a história da etnia, apresentar pratos típicos e utilizar o cauim contemporâneo como instrumento para entabular o diálogo cultural. É importante destacar que o cauim contemporâneo não substitui nem invade o espaço do cauim ritualístico, que permanece sagrado e parte de uma tradição espiritual imaterial que respeitamos profundamente.

Em um trabalho multidisciplinar, envolvendo várias culturas, observamos que quando colocamos o cauim dentro de uma garrafa de cerâmica Marajoara de Icoaraci, uma linda formação de cristais esbranquiçados aparece e se espalha majestosamente pela lateral da garrafa.

Ao tornar-se optante, a aldeia receberá todo o know-how técnico da equipe do Cauim Tiakau para montar sua unidade de produção. Não oferecemos apoio financeiro direto, pois a marca ainda está em fase inicial e também busca recursos para promover essa nova categoria de bebida no mercado. Entretanto, colocamos à disposição nosso conhecimento, dedicação e rede de apoio para viabilizar juntos essa iniciativa.

O modelo de produção é simples e acessível: uma dorna de fermentação de no mínimo 100 litros, uma panela de cocção adequada para bebidas fermentadas e um sistema de resfriamento (chiller). O custo médio é de pouco mais de R$ 50.000 – um investimento que pode ser parcialmente revertido com a venda de garrafas de cauim produzidas em cerâmica artesanal local, dentro de uma lógica de lixo zero e baixa emissão ambiental, que ainda pode gerar créditos de carbono.

Este projeto não visa transformar um símbolo espiritual em simples mercadoria. Pelo contrário: acreditamos que o cauim pode se tornar um símbolo de resistência cultural e de geração de renda, respeitando os saberes ancestrais e valorizando o que é próprio e sagrado de cada povo. Muitas aldeias hoje sofrem com a perda de áreas de caça, a poluição dos rios, a grilagem e a presença de madeireiros ilegais. E em algumas, a venda de um simples artesanato é tudo o que garante a próxima refeição.

O Surgimento de Uma nova Etapa Cultural

Sim, estamos testemunhando o surgimento de uma nova fase de nossa civilização — um movimento que desponta de forma espontânea, com profundo respeito às tradições e a colaboração ativa das etnias optantes. É como adentrar, ainda com a água nos joelhos, um vasto e promissor oceano cultural, repleto de belezas e oportunidades que apenas começamos a descobrir.

Ao longo desse trabalho ainda em fase experimental, muitas vezes ficamos surpresos e admirados com o que nos surge, como novas expressões culturais espontâneas e novas peças simbólicas.

Nesses últimos 20 anos observamos a formação de 'cristais de cauim' que se formam do lado de fora das garrafas de cerâmica, uma peça nova foi criada a partir de um tipiti com galhos de pitanga, uma peça prática que tem o propósito de indicar o grau de amadurecimento do cauim produzido, carinhosamente chamado por um descendente dos Potiguara de Tykueryru, o mesmo o Tembi Tarara, um estandarte com a representação dos oito passos do processo de produção em Tupi Antigo*. 

A esquerda o Tembi tarara, estandarte do cauim com nichos, representando os sete (ou oito) passos para a produção do Cauim no processo tradicional, e o Tykueryru pendurado na frente de uma Kaûĩ apoha (fabrica de Cauim) para avisar o grau de matiridade da bebida. - No sentido horario temos : 1 - Aîpi Kytĩ-ana (descascar a mandioca) , 2 - Ungûá pupé o-îo sok (pilar e ralar a mandioca) , 3 - Tepiti pupé a’e t-y amĩ-î (passar no tipiti) , 4 Mopopur (ferver) , 5 - Aîpi o- su'u su’u I nomu (mastigar e cuspir) , 6 - Haguino (fermentação) , 7 - Mboaruru & Kaura (filtração e clarificação) e 8 - Tîaka-une (vamos beber).

O cauim contemporâneo pode representar um futuro próspero e possível, no qual tradição e inovação caminham lado a lado. Se a sua aldeia quiser abraçar esse caminho, estamos prontos para caminhar juntos.

Quem sabe o próximo item na cultura emergente pode vir de sua iniciativa?

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*Escolhemos adotar o Tupi Antigo como idioma base do processo de produção de cauim por encontrarmos estes nos texto antigos de Lery, Stadem e Anchieta, bem como por ser a língua indígena mais falada antes da proibição do Marquês de Pombal e por ainda estar presente em diversas toponímias e identidades culturais do Brasil. 

Cada etnia optante, no entanto, é livre para traduzir e adaptar esse processo ao seu próprio idioma e contexto. 


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